Custo-efetividade do anastrozol, em comparação com o tamoxifeno, no tratamento adjuvante do câncer de mama precoce no Brasil
On Dezembro 4, 2021 by adminARTIGO ORIGINAL
Custo-efetividade do anastrozol, em comparação com o tamoxifeno, no tratamento adjuvante do câncer de mama precoce no Brasil
Custo-efetividade do anastrozol em comparação com tamoxifeno no tratamento adjuvante do câncer de mama precoce no Brasil
Marcelo FonsecaI, *; Gabriela T B AraújoII; Everardo D. SaadIII
IMestrado – Gerente Médico e Operacional do Núcleo de Gestão de Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo UNIFESP, São Paulo, SP
IIDiretora administrativa Axia.Bio Consultoria Econômica, São Paulo, SP
IIIMédico e diretor da Dendrix Ltda, São Paulo, SP
SUMÁRIO
OBJETIVO: O câncer de mama, um dos principais tipos de câncer em muitos países em desenvolvimento, é o tumor não-cutâneo mais freqüente no Brasil. A terapia hormonal é o padrão de cuidados no tratamento adjuvante da doença em estágio precoce, da doença hormonal-receptora positiva, e tanto os inibidores de tamoxifeno quanto os de aromatase de terceira geração são opções em mulheres na pós-menopausa. A relação custo-eficácia das diferentes estratégias de tratamento é de considerável interesse em sociedades que enfrentam recursos limitados.
METHODS: Na tentativa de comparar a relação custo-efetividade do tratamento inicial com o tamoxifeno ou anastrozol, foram analisados os resultados médicos e econômicos em uma hipotética coorte de mulheres na pós-menopausa de 64 anos, considerando o sistema de saúde brasileiro em 2005, a perspectiva primária do setor privado e um horizonte de vida. Dados do Estudo ATAC, modelagem de Markov, um painel Delphi modificado e microcostes (em R$) foram usados para estimar os custos e a eficácia das duas estratégias iniciais.
RESULTADOS: O modelo estimou um ganho de 0,55 anos de vida descontados para pacientes que receberam anastrozol, em relação àqueles tratados com tamoxifen. Com um custo incremental de R$ 15.141,15, o modelo estimou que a relação custo-efetividade do anastrozol, em relação ao tamoxifeno, foi de R$ 27.326,80. As simulações de Monte Carlo mostraram que aproximadamente 50% dos casos ficaram abaixo do limiar de R$ 29.229,00 por ano de vida ganho, o que é recomendado pela Organização Mundial de Saúde para o Brasil.
CONCLUSÃO: Concluiu-se que o anastrozol inicial é uma opção econômica em comparação com o tamoxifeno no tratamento adjuvante de mulheres pós-menopausadas com câncer de mama precoce com hormônio-receptor-positivo.
Palavras-chave: Inibidores da aromatase. Anastrozol. Neoplasias da mama. Análise custo-benefício. Técnica de Delphi. Cadeias de Markov. Tamoxifen.
RESUMO
OBJETIVO: O câncer de mama, o mais comum em vários países desenvolvidos, é o tumor não cutâneo mais frequente no Brasil. A terapia hormonal é o tratamento adjuvante padrão para os estágios precoces, em doença com receptor hormonal positivo, e o tamoxifeno e os inibidores da aromatase de terceira geração são opções para mulheres na pós-menopausa. A comparação do custo-efetividade dos diferentes tratamentos é de grande interesse nas sociedades com limitações de recursos.
MÉTODOS: Para comparar a custo-efetividade dos tratamentos com tamoxifeno ou anastrozol, foram analisados os resultados médicos e econômicos em uma coorte hipotética de mulheres com 64 anos de idade, considerando o sistema de saúde Brasileiro em 2005, sob a perspectiva do setor privado e o horizonte de tempo de uma vida. Usamos dados do Estudo ATAC, um modelo de Markov, um painel de Delphi modificado, e micro-costing (em reais R$) para estimar os custos e a efetividade das duas estratégias.
RESULTADOS: O modelo estimou um ganho de 0.55 anos de vida descontados para pacientes recebendo anastrozol em relação àquelas tratadas com tamoxifeno. Com um custo marginal de R$ 15.141,15, o modelo estimou que o custoefetividade do anastrozol em relação ao tamoxifeno era de R$ 27.326,80. As simulações de Monte Carlo mostraram que aproximadamente 50% dos casos estavam abaixo do limite de R$ 29.229,00 por ano-vida ganho, que é o recomendado pela Organização Mundial da Saúde para o Brasil.
CONCLUSÃO: Nós concluímos que o anastrozol é uma opção custo-efetivo comparado ao tamoxifeno no tratamento adjuvante de câncer de mama precoce em mulheres na pós-menopausa com receptor de hormônio positivo.
Unitermos: Inibidores da aromatase. Anastrozol. Neoplasias da mama. Avaliação de custo-efetividade. Técnica Delfos. Cadeias de Markov. Tamoxifeno.
INTRODUCTION
Breast cancer is the most frequent non-cutaneous tumor type in Brazil, where it accounts for approximately 50,000 new cases each year1. It is also a leading type of cancer in many other developing countries, and is considered a public health problem2. Um relatório recente sugere que a incidência de câncer de mama está diminuindo nos EUA3, mas isso é improvável em países em desenvolvimento, onde a adoção de uma dieta ocidental e o uso crescente de mamografia favorecem a incidência ou a taxa de detecção dessa doença4.
Tumores mamários expressam receptores hormonais em aproximadamente 75% dos pacientes diagnosticados após a menopausa5,6. Essas mulheres representam aproximadamente três quartos das pacientes com câncer de mama após o diagnóstico7. A terapia hormonal é considerada um padrão de cuidado no tratamento adjuvante da doença em estágio inicial nesses casos. Durante quase duas décadas, o tamoxifeno anti-estrogênio tem sido considerado a terapia hormonal padrão no tratamento adjuvante de mulheres na pós-menopausa com câncer de mama precoce8. Mais recentemente, os inibidores da aromatase de terceira geração, incluindo anastrozol, exemestano e letrozol, melhoraram as taxas de sobrevivência sem doença, em comparação com um tratamento de 5 anos com tamoxifen9.
O uso inicial de anastrozol durante 5 anos foi aprovado nos EUA em 2002, com base nos resultados do ensaio do Anastrozol, Tamoxifen, Sozinho ou em combinação (ATAC)10. No ensaio ATAC, o anastrozol produziu uma sobrevida estatisticamente significativa e mais longa livre de doenças, em comparação com o tamoxifeno ou a combinação de ambos os agentes. Além disso, o anastrozol reduziu significativamente a incidência de câncer de mama contralateral. No seguimento mediano de 68 meses, a redução relativa do risco de recorrência, de um novo câncer primário de mama ou morte por qualquer causa produzida pelo anastrozol, comparado com o tamoxifeno, foi de 17% em pacientes com tumores hormônio-receptor-positivo; neste mesmo grupo, a redução relativa do risco de recorrência ou de um novo câncer primário de mama foi de 26%11.
Dada a superioridade do tratamento inicial com um inibidor de aromatase, em comparação com o tamoxifeno10,12, a relação custo-efetividade destes dois agentes é de interesse, especialmente em sociedades com recursos limitados. Neste estudo, buscamos determinar a relação custo-efetividade do anastrozol, comparado ao tamoxifeno, no tratamento adjuvante de mulheres na pós-menopausa com câncer de mama precoce no Brasil. Além disso, medidas em termos de anos de vida ganhos com o uso do anastrozol, também foram realizadas.
METHODS
Desenvolvimento do modelo
Utilizamos uma coorte hipotética de mulheres de 64 anos de idade na pós-menopausa submetidas à cirurgia definitiva para tratamento local do câncer de mama precoce. Estas pacientes hipotéticas foram assumidas como semelhantes às do ensaio ATAC. O cenário do estudo é o sistema de saúde brasileiro no ano de 2005, com a perspectiva primária do setor privado de saúde (seguradoras, planos de saúde, organizações de manutenção de saúde e cooperativas de saúde), e com o horizonte de vida considerado. Obtivemos dados da literatura médica, incluindo o ensaio ATAC10, 11 , os preços oficiais publicados de medicamentos13, procedimentos14 e suprimentos hospitalares15 no Brasil, e estatísticas da população nacional16. Informações sobre os padrões locais de tratamento do câncer de mama, complicações e custos foram obtidas utilizando um painel Delphi modificado, um método comumente utilizado em estudos farmacoeconômicos17.
Um modelo de Markov foi desenvolvido refletindo a história natural do câncer de mama após uma cirurgia local potencialmente curativa. Os modelos de Markov são usados para representar as possíveis transições de pacientes de um estado de saúde discreto para outro em um de um número finito de estados. Tais modelos são úteis quando os riscos são contínuos ao longo do tempo, quando o timing dos eventos é importante e quando os eventos podem ocorrer mais de uma vez. Os estados de saúde utilizados no modelo foram (1) vivos e bem, (2) locorregionais ou (3) recidivas distantes, (4) experiência de evento adverso devido a tratamento adjuvante; (5) necessidade de alterar o tratamento após um evento adverso, (6) morte por câncer de mama, e (7) morte por outras causas. O modelo foi usado para simular duas coortes de pacientes iniciando o tratamento adjuvante, uma recebendo anastrozol (1 mg por dia para os 5 anos planejados), e a outra recebendo tamoxifen (20 mg por dia para os 5 anos planejados). A fim de compensar a incerteza dos parâmetros do modelo, realizamos dez mil interações Monte Carlo, com variações em todos os parâmetros.
Estados de saúde e custos
O modelo assumiu que todos os pacientes receberão tratamento adjuvante (anastrozol ou tamoxifen), e que a cada ano os pacientes transitarão entre os estados de saúde previamente descritos. Os pacientes começaram no estado de saúde “vivos e bem”. O modelo considerou as possíveis transições deste estado para aqueles que envolvem recidiva e morte por outras causas, sendo o câncer de mama contra-lateral considerado como recidiva locorregional. O modelo assumiu que após recidivas locorregionais ou distantes, nenhuma paciente retornaria ao estado “viva e bem”, já que alguns estudos sugerem que o resultado da paciente não é afetado pelo tratamento de resgate local18, e que apenas uma minoria de pacientes com recidiva local após mastectomia19 ou cirurgia conservadora20 tem uma sobrevida prolongada. Os pacientes que morreram durante a simulação não fizeram mais transições.
Microcosting foi usado para avaliar o uso de recursos e o custo de estados clínicos distintos (Tabela 1). Os custos foram calculados em reais (R$, sendo R$ 1,00 equivalente a aproximadamente US$ 0,40) utilizando uma taxa de desconto de 3%, e realizando análises de sensibilidade para os resultados econômicos variando as taxas de desconto de 1,5% a 5%, dada a incerteza inerente aos dados clínicos e econômicos. As taxas de custo-efetividade incrementais são reportadas para o horizonte de vida.
Probabilidades
Probabilidades de eventos adversos foram aquelas observadas no ensaio ATAC11. Probabilidades de recorrência derivadas da curva tempo-recorrência do ensaio ATAC, com uma redução de 26% em mulheres com tumores hormônio-receptor-positivos usando anastrozol, em comparação com o tamoxifen11. O modelo atribuiu probabilidades de recorrências locorregionais e distantes em cada grupo utilizando dados do ensaio ATAC, assumindo um padrão constante ao longo da simulação. Tais probabilidades foram de 34,16% e 65,83% para recidivas locorregionais e distantes, respectivamente, no grupo do anastrozol, e 40,11% e 59,89% para recidivas locorregionais e distantes, respectivamente, no grupo do tamoxifen10. O resultado foi simulado em termos de recidivas após o período de seguimento do estudo original, supondo-se que o benefício do anastrozol adjuvante duraria toda a vida do paciente. Para atingir tal objetivo, foi utilizada uma função exponencial ajustada para extrapolar a curva original, como mostrado na Figura 1.
Após recidiva, a probabilidade de óbito foi influenciada pelo intervalo inicial livre de doença18,19,21,22. Como a recidiva precoce tipicamente retrata um prognóstico pior, as probabilidades anuais de doença distante e morte no modelo foram maiores nos primeiros cinco anos, em comparação com os anos seguintes. Para morte por câncer de mama, as probabilidades anuais foram de 0,50 no primeiro ano, 0,41 no segundo, 0,32 no terceiro, quarto e quinto, e 0,22 a partir do sexto ano23. As probabilidades anuais de doença distante após recidiva local derivam da curva apresentada por Kamby e Sengelov24. Finalmente, a probabilidade anual de morte por outras causas foi obtida a partir das estatísticas vitais brasileiras de 200116.
RESULTADOS
Eficácia
Considerando um horizonte de vida, o tratamento adjuvante com tamoxifen resultou em 14,39 anos de vida descontados. Com o uso do anastrozol, houve um ganho adicional de 0,55 anos de vida descontados, resultando num ganho de 14,94 anos de vida descontados. A taxa de desconto utilizada para as consequências foi de 1,5%.
Custos
O custo médio de vida, descontado a 3%, foi de R$ 47.565,45 para um paciente recebendo anastrozol, e R$ 32.424,30 para um paciente recebendo tamoxifen. Para os pacientes que receberam anastrozol, aproximadamente 49% do custo foi devido ao próprio medicamento. Por outro lado, para os pacientes que receberam tamoxifen, quase 46% dos gastos foram com o tratamento de recidivas. O modelo prevê que tais pacientes gastam 17% a mais no tratamento das recidivas, quando comparados aos pacientes que recebem anastrozol. Entretanto, os pacientes que recebem anastrozol são previstos a gastar, em média, 15% mais recursos com a remissão de doenças pós-tratamento, em comparação com os que recebem tamoxifen.
Custos relacionados aos estados de saúde “recidiva locorregional”, “recidiva à distância” e “morte” são maiores no grupo de pacientes tratados com tamoxifen, enquanto o custo durante o estado “vivo e bem” é maior para o anastrozol.
Custo-efetividade
Simulação de duração envolvendo o horizonte de vida, considerando o ganho de 0,55 anos de vida descontados para pacientes que receberam anastrozol em relação aos que receberam tamoxifen, e com um custo incremental de R$ 15.141,15, o modelo estimou que o custo-efetividade do anastrozol, em relação ao tamoxifen, foi de R$ 27.326,80 (Tabela 2). Foram realizadas várias análises de sensibilidade univariadas (dados não mostrados). O modelo foi sensível ao custo da terapia adjuvante e à probabilidade de interrupção do tratamento adjuvante com anastrozol. Em relação ao tamoxifeno, o modelo foi sensível ao custo da doença metastática, à probabilidade de metástase e à probabilidade de interrupção do tratamento adjuvante com o tamoxifeno. A Figura 2 mostra os resultados de dez mil simulações de Monte Carlo para os resultados de custo-efetividade. A linha mostra o limiar de R$ 29.229,00 por ano de vida ganho, sendo que aproximadamente 50% das simulações estão abaixo deste limiar.
DISCUSSÃO
Desempenho de um modelo analítico de decisão considerando o cenário brasileiro é de fato necessário porque os tomadores de decisão em saúde, principalmente os detentores de orçamento, devem tomar decisões sobre reembolso e inclusão de determinadas drogas ou intervenções em cenários terapêuticos. Um modelo analítico de decisão considerando o cenário brasileiro também é necessário porque a transferibilidade de resultados de custo-efetividade de outros países ainda é uma questão de pesquisa, pode ser potencialmente enganosa e resultar no uso ineficiente dos escassos recursos de saúde. Os dados clínicos, por outro lado, provavelmente serão, em grande parte, consistentes entre populações de diferentes países e, portanto, os resultados clínicos podem, em grande parte, ser extrapolados para além das fronteiras nacionais25. De fato, neste modelo foi assumido que as mulheres brasileiras com câncer de mama precoce são semelhantes àquelas estudadas no ensaio ATAC. Mais uma vez, as evidências atuais sugerem que o efeito do tratamento e a redução do risco relativo podem ser mais generalizáveis do que os preços, os padrões de prática clínica e o uso de recursos26. De fato, as abordagens que têm sido utilizadas para a transferibilidade aconselham que, no mínimo, há necessidade de substituição de dados de padrões de prática específicos de cada país, bem como de dados de custo unitário26. A fim de identificar os padrões de prática clínica brasileiros e o uso de recursos, um painel Delphi modificado foi realizado com especialistas brasileiros, e os resultados foram utilizados no processo de microcustos.
Tendo em vista os últimos resultados da ATAC27, pode-se afirmar que até o 108º mês este modelo foi capaz de prever adequadamente o padrão de sobrevivência livre de doença nesta população simulada. Isto pode ser observado comparando a diferença percentual absoluta entre os pacientes com tamoxifen e anastrozol que têm doença recorrente no 108º mês no ensaio ATAC e neste modelo: 4,1%27 e 4,0%, respectivamente. Além disso, a incerteza em torno dos dados clínicos e econômicos foi avaliada neste estudo por meio de análise de sensibilidade probabilística (simulação de Monte Carlo).
Em muitos países desenvolvidos, foram definidos limiares aceitáveis de custo-eficácia para o planejamento de políticas de saúde. No entanto, essa definição não está disponível no Brasil, um país em desenvolvimento que enfrenta recursos limitados na área da saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) sugeriu um limite aceitável de custo-efetividade como sendo inferior a três vezes o produto interno bruto (PIB)28. No Brasil, onde o PIB per capita anual é atualmente de R$ 9.743,0029, uma intervenção com uma relação custo-efetividade de até R$ 29.229,00 pode, portanto, ser considerada como custo-efetiva pelos padrões da OMS. Este modelo estimou que a relação custo-efetividade do tratamento adjuvante com anastrozol, em comparação com o tamoxifeno, é de R$ 27.326,80, quando se considera uma paciente de 64 anos de idade na pós-menopausa com câncer de mama precoce e com receptores hormonais positivos.
Outros modelos de custo-efetividade para a comparação entre tratamento adjuvante com anastrozol ou tamoxifeno foram publicados. Hillner conduziu um modelo de simulação em computador avaliando os resultados de mulheres de 64 anos com câncer de mama com estrogênio-receptor-positivo tratadas com anastrozol ou tamoxifeno adjuvante durante 5 anos, usando dados do estudo ATAC30. Seu modelo previu que o anastrozol adjuvante resultaria em melhorias na sobrevida livre de doença de 2,9 e 5,3 meses após 12 e 20 anos, respectivamente. Em termos de sobrevivência global, tais melhorias seriam de 0,9 meses e 2,0 meses, respectivamente, resultando em custo-efetividade incremental inferior a R$100.000 por ano de vida após 12 anos. Além disso, a inclusão de ponderações de qualidade de vida para resultados não fatais favoreceu modestamente o anastrozol no curto prazo; no longo prazo, entretanto, um risco aumentado de fratura do quadril pelo uso do anastrozol reduziria esse benefício. Concluíram que, do ponto de vista da sociedade, a mulher média experimentará um benefício global vitalício pelo uso adjuvante do anastrozol, com o custo incremental desse benefício próximo do limite superior da faixa de custos incrementais arbitrariamente aceitos na América do Norte31. Uma segunda análise realizada nos Estados Unidos, em nome do Grupo de Trialistas da ATAC, concluiu que o anastrozol inicial é uma alternativa econômica ao tamoxifeno para o tratamento adjuvante de mulheres pós-menopausadas com estrogênio-receptor-positivo, câncer de mama precoce32.
Rochhi e Verma realizaram uma análise econômica comparando o anastrozol e o tamoxifeno no tratamento adjuvante de pacientes com câncer de mama precoce pós-menopausa com hormônio-receptor positivo, usando a paciente típica do ensaio ATAC ao longo de uma vida e a perspectiva da saúde pública canadense33. Nesse estudo, a utilização de recursos foi extraída de Statistics Canada, complementada por um painel de especialistas. De acordo com o seu modelo, as pacientes tratadas com anastrozol incorreram em custos adicionais de tratamento, em comparação com as pacientes que receberam tamoxifen, mas estes custos foram parcialmente compensados pela redução das recidivas do cancro da mama. As pacientes tratadas com anastrozol foram projectadas para experimentar reduções absolutas de 5,6% no risco de recidiva do primeiro cancro da mama e de 2,8% no risco de morte por cancro da mama. Isto correspondeu a 30.000,00 dólares canadianos por ano de vida ganho e 28.000,00 dólares canadianos por ano de vida ajustado à qualidade ganha. Os autores concluíram que a terapia com anastrozol é eficaz e econômica como terapia adjuvante inicial nesta população de pacientes, quando comparada ao tamoxifeno.
Outros estudos avaliaram o impacto econômico do tratamento adjuvante com anastrozol, quando comparado com o tamoxifeno, em diferentes cenários de saúde. O anastrozol foi considerado rentável a longo prazo na Eslovénia34 e na Bélgica35 , tendo em conta as perspectivas do prestador de cuidados de saúde e do sistema de saúde, respectivamente. Além disso, um segundo estudo do Canadá utilizando a perspectiva do pagador direto concluiu que o tratamento inicial com anastrozol é uma alternativa econômica a 5 anos de tamoxifen36. Além disso, com base nos resultados do ATAC, e da perspectiva do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, Mansel et al. mostraram recentemente que a relação custo-eficácia incremental estimada do anastrozol em comparação com o tamoxifeno foi de £17.656 por QALY ganho. Isto considerou cenários clínicos similares aos estudos acima mencionados, com uma probabilidade maior que 90% de que a relação custo-eficácia do anastrozol estava abaixo de £30.000 por QALY ganho (o limiar do Reino Unido). Os resultados desse estudo foram robustos para todos os parâmetros testados na análise de sensibilidade37,
A relação custo-eficácia do tratamento do câncer varia claramente em todo o espectro epidemiológico e econômico globalmente diverso38. Apesar de as novas terapias serem tipicamente mais caras que as alternativas existentes, seus preços tendem a diminuir ao longo dos anos. Além disso, a disponibilidade de medicamentos genéricos pode diminuir ainda mais os custos de tratamento. Modelos como o utilizado neste estudo são bastante sensíveis a aumentos no preço dos medicamentos30. Como corolário disso, a diminuição da relação de preços entre o anastrozol e o tamoxifeno provavelmente diminuirá o custo incremental do anastrozol. Além disso, a relação custo-benefício de qualquer tratamento de câncer variará de acordo com a expectativa de vida do paciente. No Brasil, a expectativa de vida das mulheres de 64 anos é atualmente de 19,3 anos39.
CONCLUSÃO
Dada a superioridade clínica do anastrozol sobre o tamoxifeno10,11,27, e o custo-efetividade incremental aceitável desta estratégia – mostrado em vários estudos30, 32-35 e confirmado neste -, nossa análise sugere que o tratamento inicial com anastrozol por 5 anos pode ser a estratégia adjuvante preferida para mulheres brasileiras pós-menopausa com câncer de mama hormonal positivo, precoce.
SUPORTE FINANCEIRO:
AstraZeneca do Brasil
Conflito de interesse: nenhum
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